Achei muito interessante vc propor, pela Análise de Discurso, compreender o “racionalismo” em João Cabral de Mello Neto, como funcionamento discursivo, posição ideológica na língua, fugindo às classificações dadas de antemão, como colocá-lo pela crítica como um poeta da razão. O importante seria desconstruir esse percurso taxionômico/classificatório/nomenclaturas e compreender o seu percurso de produção poética, significando as posições teórico-ideológicas que lá se colocam, o escritor.
O Racionalismo, enquanto um lugar epistemológico, ou seja, um lugar de construção do conhecimento, supõe que o conhecimento é adquirido pela Razão, explicitando o célebre lema cartesiano Penso. Logo, sou..., em que o sujeito constrói-se como esse EU, que é porque pensa. Nesse contexto, a lógica constitui a trama do pensamento e do bem falar através de uma gramática lógica e normativa.
Esses sentidos, enquanto posição ideológica do sujeito escritor, são interessantes quando comparecem na poesia. A minha pergunta é, de que modo eles comparecem na poesia de Cabral de Melo?
Então vc trata de uma linguagem que foge à realidade, construindo em Cabral de Melo Neto um real outro. Sugiro vc lidar com a noção de contradição, conforme Pêcheux, em que um enunciado pode significar diferentemente, em relação à posição racionalista, por exemplo.
Vc faz uma leitura interessantíssima, mostrando o funcionamento de um não-racionalismo em Cabral. Sugiro apenas vc operar com o dispositivo teórico da Análise de Discurso no que concerne à posição ideológica e à posição-sujeito.
Essas noções aproximam a teoria e a materialidade do texto. Aliás, se o drama é uma paráfrase em relação às narrativas do Evangelho, acredito que esse ponto poderia ser melhor explorado, até para dizer o que em Cabral repete do texto sagrado, e o que produz de diferente. O funcionamento do Interdiscurso pelo já-dito. Essas redundâncias analíticas são fundamentais, num trabalho de linguagem.