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Da dimensão habitual do comer ao desequilíbrio entre corpo sujeito (Leib) e corpo objeto (Körper): significados da experiência hiperfágica na obesidade

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Os transtornos alimentares podem ser compreendidos fenomenologicamente como um modo de existência cujo ato de comer ocupa um lugar central e se configura, de forma geral, como fonte de sofrimento na medida em que há uma incapacidade de controlar os comportamentos alimentares. No caso da experiência hiperfágica, ocorre um excesso constante diante da impossibilidade de não comer, um vivido reconhecido por sua perda de controle, intensidade, excesso e repetição. Problema de saúde pública mundial, a obesidade é um fenômeno caracterizado principalmente pelos danos possíveis causados à saúde e que, em alguns casos, pode estar associada com a hiperfagia. Neste trabalho, focamos a experiência hiperfágica vivida por pacientes obesos. Discutimos, inicialmente, a contribuição da noção de corpo em Merleau-Ponty e Tatossian como via de compreensão desta experiência no que tange, respectivamente, à dimensão habitual do comer e ao desequilíbrio entre corpo sujeito (Leib) e corpo objeto (Körper). Em seguida, a partir do relato de dois pacientes de um serviço de medicina da obesidade na França, discutimos a experiência de corpo vivida por estes pacientes. Através de uma entrevista fenomenológica, indagamos sobre a experiência de ser considerado obeso e sobre a experiência de comer. Como resultado, destacamos três pontos que serão nossa via principal de discussão: os sentimentos corporais, através da dificuldade em sentir e controlar o próprio corpo, o comer como um preenchimento de um vazio e como necessidade de um acontecimento e a possível dimensão aditiva presente nesta experiência. No relato dos pacientes é possível observar a presença de um grande sofrimento atrelado à condição corporal, à impossibilidade de não comer e de não poder se controlar. O corpo é posto como objeto face uma ação que é posta como necessária.