GARANTIA DO DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA NO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO: UMA REVISÃO NARRATIVA

- 311007
Relato de pesquisa - Oral
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Resumo

Introdução

A temática da alimentação nas prisões teve um aumento exponencial no número de estudos publicados por distintos autores no contexto internacional nos últimos 20 anos. 

Uma revisão de escopo recente examinou pesquisas sobre a alimentação no sistema prisional, publicadas em revistas de língua inglesa revisadas por pares desde 1995, buscando ampliar a compreensão sobre a experiência vivida das pessoas no encarceramento e fornecer informações sobre  programas que buscam melhorar a qualidade de vida das pessoas encarceradas. Foram identificados 38 artigos, incluindo 10 estudos quantitativos e 28 estudos qualitativos (SMOYER, 2019).

Os dados de 2021 da plataforma World Prison Brief mostraram que o Brasil ocupava o 3º lugar no ranking de países com maior número de pessoas presas no mundo, com mais de 811 mil pessoas com algum tipo de privação de liberdade, atrás apenas dos EUA com pouco mais de 2 milhões e China com aproximadamente 1,7 milhões de pessoas com algum tipo de privação de liberdade. Dentro do sistema penitenciário, a fome e a má nutrição manifestam-se como um fenômeno central, utilizado como instrumento de penalização nos presídios e que remete aos cenários de miséria ligados à história do Brasil.

Um dos mecanismos para garantia do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA) no Brasil foi descrito no texto da Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN), e a mesma é importante pois torna o DHAA e a garantia da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) objetivos e metas políticas a serem cumpridos (BRASIL, 2006). Em 2010, após um histórico processo de mobilização social, foi aprovada a Emenda Constitucional nº 64 que incluiu a alimentação no artigo 6º da Constituição Federal de 1988 juntamente aos demais direitos sociais (BRASIL, 2010).

Objetivo

O objetivo deste estudo foi realizar uma revisão narrativa para a descrição e compreensão da finalidade, dos objetivos, das metas e do contexto social referente à garantia do Direito Humano à Alimentação Adequada para as pessoas privadas de liberdade no sistema penitenciário brasileiro. 

Métodos

Optou-se pela realização de uma revisão narrativa pois a mesma pode agregar e atualizar conhecimentos sobre uma temática específica em um breve espaço de tempo, sendo adequada para revisões mais amplas e para a compreensão contextual de cenários complexos (ROTHER, 2007).

Esta revisão narrativa foi baseada em artigos científicos e legislações sobre o DHAA e a SAN no sistema penitenciário brasileiro e no cenário internacional, buscando-se apontar como esses direitos são efetivados, ou não.

A revisão foi realizada a partir da legislação, de documentos técnicos e de artigos científicos. Os primeiros documentos foram localizados nos sites do governo, entre eles o Portal da Câmara dos Deputados, Poder Legislativo e do Ministério da Justiça e Segurança Pública, buscando-se apontar o arcabouço legal que abrange a alimentação no sistema penitenciário brasileiro como direito da pessoa privada de liberdade. 

Os artigos científicos foram selecionados nas bases de dados bibliográficos Portal de Periódicos da CAPES, Scopus, Pubmed, Scielo e Web of Science, além de uma varredura no Google Acadêmico. Em todas as bases foram utilizadas as palavras-chave e/ou termos indexados (“food security” AND incarceration”), (prison AND food), (“direito à alimentação” AND cárcere), (“direito à alimentação” AND presídios), (“direito à alimentação” AND “sistema penitenciário brasileiro”) em português e inglês. Os critérios para a inclusão dos documentos foram: possuir acesso disponível; e ter o direito à alimentação no sistema prisional como pelo menos um dos objetos de pesquisa. Os artigos excluídos não estavam adequados aos critérios de inclusão e/ou apresentavam duplicidade. 

Até o presente momento também foram consultados para a construção da revisão: documentos oficiais da Organização das Nações Unidas (ONU); orientações do Conselho da Europa; recomendações da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO); legislação e portarias interministeriais do Governo Federal; resoluções do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP); programas e políticas públicas do Ministério da Justiça, Ministério da Saúde e Ministério do Desenvolvimento Social; recomendações e relatórios das Conferências de SAN; diretrizes dos Planos Estaduais de Segurança Alimentar e Nutricional (PESAN).

Resultados/Discussão

Foram selecionadas 22 referências. A revisão permitiu a contextualização da temática no âmbito científico, sendo observado que o interesse pelo tema e as publicações vêm aumentando visto que 62,5% destas foram publicadas nos últimos 5 anos. Do total de artigos, 41,6% foram desenvolvidos em países na Europa, seguidos por 25% no Brasil, 20,8% nos Estados Unidos e o restante em demais países. Com relação ao método dos estudos, destacaram-se as entrevistas semiestruturadas (36,3%), seguidas pela análise de fontes bibliográficas (27,2%), observação participativa (18,1%), estudo etnográfico (4,5%), estudo transversal com amostragem por conveniência (4,5%), revisão sistemática (4,5%), revisão de escopo (4,5%) e estudo quantitativo (4,5%). Não foram encontrados estudos com características de avaliação referentes ao direito à alimentação nos sistemas prisionais nos países.

Considerações Finais

Foi identificada uma lacuna de estudos na literatura sobre a garantia do direito à alimentação para pessoas privadas de liberdade. Sugere-se a realização de novos estudos a fim de qualificar o debate acadêmico, o papel do nutricionista no sistema penitenciário e as ações do Estado nesse contexto.

Referências bibliográficas

BRASIL. Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006. Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional. Cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN com vistas em assegurar o direito humano à alimentação adequada e dá outras providências. Brasil, 2006. 

BRASIL. Resolução nº 3, de 05 de outubro de 2017. Dispõe sobre a prestação de serviços de alimentação e nutrição às pessoas privadas de liberdade e aos trabalhadores no sistema prisional.Brasil. 

BRASIL. Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Lei de Execução Penal. Brasil, Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm. Acesso em: 29 jul. 2022. 

BRASIL. MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA. Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias: período de julho a dezembro de 2021. PERÍODO DE JULHO A DEZEMBRO DE 2021. Disponível em: https://www.gov.br/depen/pt-br/servicos/sisdepen. Acesso em: 23 jun. 2022.

BRASIL. Constituição (2010). Emenda Constitucional nº 64, de 04 de fevereiro de 2010. Direito Humano À Alimentação Adequada. Brasília, 2010.

DUNCK, José Augusto Magni; DOS SANTOS, Nivaldo. A efetividade do direito humano à alimentação adequada às pessoas privadas de liberdade nos cárceres brasileiros e o papel das instituições de justiça. Revista de Direitos Humanos e Efetividade, v. 3, n. 2, p. 58-73, 2017.

ROTHER, E. T. Revisão sistemática X revisão narrativa. Acta Paulista de Enfermagem, São Paulo, v. 20, n. 2, p. v–vi, 2007.

SMOYER, Amy B. Food in correctional facilities: A scoping review. Appetite, v. 141, p. 104312, 2019.

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Instituições
  • 1 Universidade Federal de Santa Catarina
Eixo Temático
  • Direito Humano à Alimentação Adequada
Palavras-chave
Segurança Alimentar e Nutricional
Cárcere
Pessoas Privadas de Liberdade