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Cordéis Joseenses - da educação à resistência cidadã

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Há cerca de dez anos, iniciou-se em São José dos Campos, interior de São Paulo, a publicação dos Cordéis Joseenses, folhetos de cordel produzidos por Paulo Barja sobre temas diversos. Na época, uma das principais motivações para o início desta produção literária era suprir a carência local de folhetos de cordel voltados mais diretamente para crianças e adolescentes. No desenvolvimento do projeto, buscou-se aliar a tradição da métrica e da forma (folhetos pequenos, curtos e de baixo custo) a uma linguagem acessível, de modo que os cordéis pudessem inclusive apresentar potencial para adoção como material paradidático no contexto urbano paulista (o projeto até hoje se encontra sediado em São José dos Campos, daí o nome Cordéis Joseenses). Embora o autor esteja profissionalmente vinculado a uma instituição de ensino universitário, com o passar do tempo, parte da produção cordelística passou a ocorrer como fruto de oficinas realizadas em instituições de ensino diversas e envolvendo alunos dos diferentes níveis de ensino – Fundamental (primeiro e segundo ciclos), Médio e Superior. Desta forma, parte dos Cordéis Joseenses produzidos consiste em textos criados coletivamente ou inspirados por vivências criativas em grupo. Nestas, a criação coletiva sempre respeitou a espontaneidade – as oficinas de cordéis realizadas nunca apresentaram restrições quanto aos temas dos folhetos. Além das obras impressas, o projeto inclui também um blog, cuja apresentação informa (desde 2010) que os Cordéis Joseenses “tratam de histórias e temas diversos, como educação ambiental, política e saúde, incluindo adivinhas e fábulas para crianças de todas as idades”. Ao completar 10 anos de trajetória e cerca de 80 cordéis publicados, a grande maioria destes como produção independente (ou seja, com impressão viabilizada por financiamento próprio), fazemos aqui um balanço a respeito da evolução dos temas tratados por estas publicações ao longo do tempo. O objetivo é avaliar se houve uma mudança de rumos na produção em relação à proposta inicial do projeto literário. Em termos metodológicos, como recorte para análise, adotamos aqui a classificação dos folhetos de cordel em três eixos e/ou dimensões: i) um eixo temático (no qual dividimos a investigação nos tópicos “ciência/educação”, “política/cidadania” e “outros”); ii) um eixo referente ao público-alvo (utilizando-se a divisão entre “infantojuvenil” e/ou “adulto”); e iii) um eixo de autoria (classificando-se cada folheto como produção individual ou coletiva). No eixo referente ao público alvo, para efeito estatístico, os cordéis voltados para o público em geral foram considerados tanto “infanto-juvenil” quanto “adulto”. A análise cronológica efetuada deixa clara a transformação do projeto ao longo do tempo; se, por um lado, a produção cordelística segue buscando atender tanto ao público infantojuvenil quanto ao público adulto (com crescimento do número de textos voltados a este último), por outro lado é inegável o aumento da presença de um viés político nos textos, principalmente no período que se inicia a partir da metade do ano de 2016 (época do impeachment de Dilma Rousseff). Esta mudança no percurso criativo (e temático) evidencia o caráter de resistência social e política da produção literária, uma vez que surge como reflexo (e consequência) da evolução histórica recente do país. De fato, o silenciamento e/ou postura acrítica da maior parte da mídia de massa a respeito de questões políticas (como a perda de direitos sociais e outras) tem impelido educadores e escritores à busca da ocupação de espaços (e formas) alternativos, para a produção de textos que estimulem o desenvolvimento de um pensamento crítico por parte de jovens e adultos. Deste modo, pode-se dizer que, hoje, um dos principais objetivos dos Cordéis Joseenses é colaborar para o fortalecimento da noção de cidadania e para uma conscientização política que se deseja independente da idade dos leitores.