85795

Um diálogo entre o curta Águas de Romanza e as questões socioambientais

Favoritar este trabalho

Este trabalho tem por objetivo analisar e discutir as potencialidades que o curta-metragem cearense Águas de Romanza (2002), baseado no conto homônimo de Eugênio Leandro, pode expressar em diferentes aspectos das práticas sociais que incluem a ciência, o ser humano e o meio ambiente na perspectiva da Marxista Educação Ambiental Crítica. Tal trabalho se justifica devido a importância de os sujeitos compreenderem seu contexto em diversos âmbitos para que eles possam ter práticas sociais autônomas (SAVIANI, 2012). Nesse sentido, o cinema vem a ser um meio para que se alcance tal autonomia. Este meio pode ser entendido, muitas vezes, puramente como arte, mas ele diz respeito a um processo social que envolve vários sujeitos: artistas, investidores, distribuidores, dentre vários outros até finalmente chegar ao público este último, muitas vezes, selecionado (BERNARDET, 1980). Nessa perspectiva, o cinema, sendo fruto de relações sociais, expressará também as contradições dessas relações, estas se darão nos diversos âmbitos da sociedade civil como na cultura, política, economia, ciência e meio ambiente. Entendendo o meio ambiente a partir da Teoria Marxista da Educação Ambiental Crítica que não se resume ao sentido naturalista, mas como lugar onde o ser humano (re)constrói as condições de sua existência (TOZONI-REIS, 2005). O curta de 15 minutos Águas de Romanza, dirigido por Glaucia Soares, Patrícia Baía conta a história de Romanza, uma menina de seis anos de idade do sertão nordestino que nunca viu a chuva, e sua avó idosa e doente que buscando realizar o sonho da criança de ver a chuva, contará com a ajuda de um caixeiro viajante para realizar esse sonho de uma maneira inusitada. Nessa perspectiva, realizando uma análise qualitativa do curta metragem, que se propõe a compreender seus significados, sentidos, representações, intencionalidades (DEMO, 1998) - elencamos três aspectos de destaque do filme que se relacionam diretamente com o meio ambiente, de acordo com referencial teórico adotado. Tais aspectos são os tecnológicos, culturais e econômicos. O meio ambiente apresentado no curta, do ponto de vista natural, demonstra o sertão como um local de difícil manutenção de vida, o que também reflete nos desejos e aspirações dos personagens, como no sonho da criança de ver a chuva. Neste sentido, o ambiente assume um caráter crítico, seguindo a vertente da educação ambiental crítica, que é uma práxis social, a qual busca a transformação e emancipação do sujeito como um todo e não apenas de forma fragmentada (TOZONI-REIS, 2007). Esta abordagem será utilizada neste trabalho para compreender o sujeito e suas relações com a sociedade na qual está situado, juntamente com os aspectos tecnológicos, culturais e econômicos. A cultura pode ser entendida como os conhecimentos, as crenças e as ideias de um povo (SANTOS, 1983). Podemos ver, desde o princípio, como a cultura permeia a vida dos personagens, seja pela religião, histórias contadas pela avó e pela linguagem dos mesmos. Os aspectos tecnológicos estão relacionados com o conhecimento que esse povo possui, o ambiente e o manejo do ambiente. No curta podemos ver dois tipos de tecnologia, o primeiro, rudimentar, se refere a semeadura realizada pelos familiares de Romanza, que se dá manualmente com a ajuda de animais e ferramentas básicas como um carrinho para abrir a terra. A segunda se refere a uma tecnologia de produção agrícola mais avançada que possibilita uma plantação em larga escala com a superação da necessidade chuvas para a irrigação, que se dá com o bombeamento da água. Assim, vemos que o meio ambiente está intimamente ligado a cultura, tecnologia e economia. Neste sentido, o curta nos permite levar algumas problematizações: Porque a família de Romanza não tem acesso a tais tecnologias avançadas? Porque ela aparenta não possuir conhecimento científico? Várias podem ser as respostas, mas a que diz respeito ao não domínio do poder econômico pela família de Romanza é o principal. Sem o capital não podem ter acesso a tecnologias, técnicas e todo o conhecimento científico que está aplicado a uma produção em larga escala. O atual modelo capitalista contribui para que a maioria das relações sociais se baseiem na forma de exploração, assim como no curta, pode-se perceber como é grande a desigualdade econômica em locais que são próximos (CHAUÍ, 1980). Nessa perspectiva, a compreensão do meio ambiente necessita ser entendida a partir da totalidade e não de maneira fragmentada, levando em conta os diversos aspectos tecnológicos, culturais, econômicos que permeiam as práticas sociais dos sujeitos (TREIN, 2012). Para tanto, a Educação Ambiental Crítica pode, a partir do cinema, promover diálogos que visem uma compreensão sistêmica e crítica da realidade sendo o curta o Águas de Romanza um ótimo meio para tal.