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Diários de experimentações africanas: criação e divulgação com devires negros

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Este trabalho pretende apresentar pensamentos sobre algumas experimentações produzidas a partir de encontros entre África, alunos e professor em escolas de Limeira-SP. Para que isso fosse possível, buscamos maneiras outras de dizer sobre determinadas contaminações e agitações moleculares na sala de aula, os devires-negros. Zona de vizinhança, moléculas em movimento, de dupla captura: professor-aluno-África e aluno-África-professor. A fim de dizer sobre essa vibração, buscamos na produção de Diários de experimentação, um processo criativo, que nos permitia pensar, sentir e divulgar a África de maneira que não fosse pré-determinadas. De início, esse diário não aceitava as ideias. Resistia à outra escrita. Queria tudo datado e linear, desejava uma lógica já pronta. Afinal, a maneira como esse material havia sido educado era de forma sistemática. Em seu corpo-papel-páginas brancas, a linha do tempo estava sempre se arranjando em horas, dias, meses e anos. Apesar da relutância, percebeu a vontade acontecendo dentro dele. Vontade de ser outro. Era um desejo de entregar-se às rajadas de ventos africanos que, por vezes, em sala de aula, com seus alunos, redemoinham e tonteiam os arranjos de seu corpo e de sua escrita. Diante dessa pequena fresta de criações outras, algo surgia. Um movimento se iniciava, ele se aproveitava para começar a tecer as primeiras palavras, imagens e sons outros. Ainda havia certa linear. Queria o caos. Mas como? Ouviu de alguém, um desses ventos africanos, pegue a linha do horizonte com o suspiro, passe-a na agulha e costure nas águas do tempo variações infinitas de ser. Deixe a escrita fugir pelas linhas. Foi então que, diante de seu corpo de papel em branco, ele viu uma linha vermelha passada no buraco de uma agulha. Por que não? Divagou. Começou. Furava, costurava, dava nó, passava de um lado, puxava de outro, fazia um trançado aqui, arrematava ali e pronto. Começou a construir em seu corpo uma lógica outra. Abria-se as outras experimentações. Seu diário de ventos soprados por linhas de horizontes infinitos começava. E então, os espaços preenchidos com datas programadas em seu corpo-papel-linear começavam lentamente a serem varridos. Modos outros de vida se desenrolavam, em linhas, pelos ventos da África. A linha do tempo começava a ser afogada. Diante daquela sugestão, o objeto se colocava a buscar maneiras de (des)fiar seus fios-escritas-papel-África. Era uma aposta. Podia não dar certo. Pensou. Mas, sentia muita vitalidade nessas primeiras criações com linhas. O que pode emaranhado? O que produz a linha desmedida em meus registros diários? Seu desejo agora era escapar daquele tempo controlado. Começou a bordar seu tempo labiríntico, tempo informal, plástico (PELBART, 2004). Foi assim que esse material surgiu, como uma potência criação. Com ele podíamos experimentar em palavras, imagens, sons e costuras, capturas moleculares quase imperceptíveis. Registrar os devires negros que nos rodeavam e resistiam timidamente pelos cantos sala de aula. Buscar neles, novas experiências do dizer, do fazer, do escrever e do criar que nos permitia escapar, por alguns minutos que fosse, de modelos já dados. Assim, pensamos a partir brechas possíveis, ou não, de serem abertas em modelos enrijecidos, referências de uma divulgação que se dá, muitas vezes, apenas, pelos livros didáticos, lugar onde as imagens, palavras e sons da África, se mostram já prontas. Resistimos. Desejamos encontrar com outros seres, outras coisas. Queríamos inventar. Por que não costuras e linhas. Quem sabe com elas, não nos deparávamos com uma vida, cuja percepção está sempre a se guiar pelos cantos dos olhos. Um lugar onde os encantos dos gestos, das palavras, dos sorrisos, das imagens e dos sons se manifestam, por fezes, de formas imprecisas.