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A divulgação científica e a inclusão social

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Este trabalho objetiva analisar a divulgação científica a partir de sua dimensão inclusiva, com o intuito de estimular reflexões acerca de seu potencial enquanto instrumento de transformação social. A relevância desse tema justifica-se em virtude do importante papel que a divulgação científica pode desempenhar na atenuação de um dos mais estruturais aspectos da desigualdade social: a democratização do acesso à cultura e à educação de qualidade. Em geral, o contato que a população costuma ter com a ciência limita-se ao período escolar, no âmbito da educação formal. Considerando-se o agravante de que, infelizmente, não raras vezes, o ensino na rede pública de educação básica é significativamente deficitário, afetado pela precariedade do sistema, a educação científica dos estudantes tende a estar aquém do recomendável. Essa situação pode comprometer, por consequência, não apenas a formação acadêmica, mas a consciência crítica e, em sentido amplo, a inclusão social e o pleno exercício da cidadania. Dado o exposto, nossa pesquisa parte da questão: como a divulgação científica pode contribuir, efetivamente, para a inclusão social? Serão desenvolvidas análises e reflexões teóricas acerca do tema, ilustradas por exemplos e fundamentadas por algumas de suas principais referências bibliográficas na atualidade. A própria etimologia da expressão divulgação científica, sobretudo do primeiro vocábulo que a compõe, reitera a essência dessa tese. O substantivo divulgação originou-se do latim divulgatĭo,ōnis, com o significado de 'ação de espalhar, publicar, divulgar' ao público (vulgus). Pressupõe-se, portanto, que um dos principais propósitos da divulgação científica é o de tornar a ciência, a priori restrita à academia, acessível e compreensível ao público. Autores como Mendonça (2010, p. 3) endossam essa perspectiva, ao afirmar que “no caso da divulgação científica, como a própria etimologia da palavra divulgar sugere, trata-se de fazer chegar à população, de forma a um tempo rigorosa e simples, a dinâmica da ciência na vida cotidiana”. Assim, uma das lacunas que a divulgação científica pode ajudar a suprir é, justamente, um dos pilares da desigualdade social: o direito à cultura e à educação de qualidade, em geral inacessíveis, principalmente, à população mais vulnerável. De acordo com Moreira (2006, p. 11), “Um dos aspectos da inclusão social é possibilitar que cada brasileiro tenha a oportunidade de adquirir conhecimento básico sobre a ciência e seu funcionamento que lhe dê condições de entender o seu entorno (...) e de atuar politicamente com conhecimento de causa” (grifos nossos). Não por acaso, no antigo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), o Departamento de Popularização e Difusão da Ciência e Tecnologia (DEPDI) integrava a estrutura da Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social (SECIS). A missão institucional a ele atribuída era a de “promover a inclusão social por meio de ações que melhorem a qualidade de vida, estimulem a geração de emprego e renda e conduzam a um desenvolvimento sustentável do país, tendo em vista a difusão do conhecimento” (grifos nossos). Em 2016, no entanto, o atual Governo Federal, ao fundir o MCTI com o Ministério das Comunicações, também fundiu a SECIS com outra Secretaria – a Secretaria de Políticas e Programas de Pesquisas e Desenvolvimento (SEPED), dando origem a uma nova pasta, denominada ‘Secretaria de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento’. Dentro dela, há três departamentos, destinados a políticas e programas de ciências (1), desenvolvimento (2) e inclusão social (3). Pelo exposto, percebe-se que a nova Secretaria não prioriza a popularização e difusão da C&T em nenhum de seus departamentos (como o extinto DEPDI), tampouco a relaciona à inclusão social (como quando o DEPDI integrava a SECIS). A partir das pesquisas desenvolvidas neste trabalho, indicamos, como resultados parciais de nossa análise teórica, as seguintes considerações: o potencial educativo e inclusivo da divulgação científica, em sentido amplo – isto é, para além da educação formal – é evidente e, praticamente, consensual. Sua efetividade em larga escala, porém, depende de sua institucionalização, que viabilizaria o necessário apoio a iniciativas dessa natureza. Em 2015, o então Diretor do extinto DPDI afirmou que “Após onze anos da criação do Departamento de Popularização e Difusão da Ciência, existe uma percepção coletiva de que hoje chegamos a um arcabouço de ações que constituem uma política nacional de divulgação de C&T”. (FALCÃO, 2015, p. 52). Apesar do referido ‘arcabouço de ações’, porém, o fato é que ainda não foi estabelecida uma política pública nacional para a área. Essa ausência de legislação oficial tende a comprometer a oferta de oportunidades e a realização de ações de modo sistemático, regular e abrangente, visto que a maior parte das iniciativas limita-se às regiões Sul e Sudeste. De acordo com Massarani e Moreira (2012, p. 23-24), “ainda há um longo caminho até que possamos afirmar a existência de uma divulgação da C&T de qualidade e uma apropriação social adequada do conhecimento científico e tecnológico que abranja toda a sociedade brasileira. (...) Mas se inicia com os primeiros passos”.