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Comunidade Quilombola do Varzeão: uma história de luta por seus direitos.

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Este artigo trata de alguns aspectos da história de lutas da Comunidade Quilombola do Varzeão, no município de Doutor Ulysses, no Paraná, certificada pela Fundação Palmares, em 2006. Essa comunidade de negros livres e proprietários de terras teve sua história embranquecida pela construção de uma memória de que João Alves de Souza teria sido um fazendeiro e tropeiro branco, que teve sua filha Carolina casada com seu empregado negro Feliciano. Na história local e inclusive na própria memória da comunidade, este casal interétnico teria originado a comunidade. Mas as Listas Nominativas de Habitantes da Vila de Castro, já em 1820, mostram que João Alves de souza, bem como seus pais e sua esposa eram negros, livres e possuíam uma posse de terras, onde plantavam lavouras. O seu atestado de óbito, de 1877, confirma que era negro. Segundo Lima (2002), em 1806, na região de Castro, 24,4% dos negros já eram livres e encabeçavam 19,8% dos domicílios. No início do séc. XX, o local onde moravam, a Vila do Varzeão, significativamente passou a denominar-se de Vila Branca com a colonização de brancos que ali foram se estabelecendo. (SEYFERTH, 1996; SCHWARCZ, 2001), Nesta época iniciaram os problemas da comunidade de descendentes de João Alves de Souza e sua esposa Escolástica. O advogado Marins Alves de Camargo, irmão do Presidente do Paraná Afonso Alves de Camargo, das elites políticas e econômicas do período, iniciou, em 1918, a partilha dos bens de João Alves de Souza e seus herdeiros, entre eles a Fazenda Arroio Claro, registrada na Paróquia de Castro em 1856 e em inventários de 1877, 1886 e 1904, em Castro e Jaguariaíva. A partilha seria efetivada em 1927, mas desde o início dos anos de 1920, Marins já estava vendendo parte destas terras. Segundo Tourinho (1998), interventor do Paraná, em 1930, Marins foi acusado de possuir metade das terras do Paraná. De forma "legal" ou fraudulenta estas terras foram alvo da cobiça de grandes fazendeiros, desde os anos de 1940 (Moysés Lupion, João Sguario, Cel. Amazonas Ribas) e posteriormente empresas de reflorestamento, desde a década de 1970 (Plantec, Tempo, Línea, Floema, Edo Mallmann). Ainda em 2008, ocorreram queima de casas, na região reocupada do Gramadinho, onde a comunidade viveu do final do séc.XIX até o início dos anos de 1980. Utilizo as discussões teóricas de Almeida (2002), Arruti (1998), Bandeira (1990), Barth (1998), Carvalho (1995), Leite (1996, 2000), O'dwyer (1995,2002), Oliveira (2001) e Weber (1983) para tratar da sua constituição como comunidade quilombola e da sua luta por direitos identitários e territoriais.