ANAIS DO 15º CONGRESSO BRASILEIRO DE MEDICINA DA FAMÍLIA E COMUNIDADE

Introdução: Delírio de Gravidez é condição rara na qual a pessoa apresenta forte convicção que está grávida apesar do resultado negativo de exames. Diferencia-se da Pseudociese por não apresentar sintomas físicos de gravidez. Relato: M., mulher, jovem, negra, mudou-se para área da UBS após conseguir emprego e sair da casa do pai que era violento e alcoolista. Alguns meses depois M. foi demitida e queria processar a empresa, pois estaria grávida. Não aceitava o diagnóstico de não gravidez apesar da ausência de mudanças corporais por meses. Mantinha menstruação, mas explicava como perda sanguínea da gravidez. Recusava-se a atendimento por psicóloga que não fosse negra, pois uma "branca não a entenderia". Conseguimos atendimento com psicoterapeuta negra, mas M. não aderiu. Não tinha amigos. Expunha-se em redes sociais na internet e buscava outros serviços de saúde e jurídicos queixando-se que não acreditavam nela. Na abordagem priorizamos o vínculo com M., trabalhando na perspectiva de redução de danos, buscando diminuir sua exposição pública e situação de violência. Acolhemos sua preocupação com a gravidez, negociando medidas que ela desejava como pré-natal. Tentávamos com isso uma janela de oportunidade para psicoterapia ou medicamentos. Próximo das 42 semanas de gestação, M. mudou-se de cidade. A leitura do livro "Rubi", uma ficção sobre uma mulher negra que ficou louca nos auxiliou a perceber uma narrativa do caso. Conclusão: considerar a condição de mulher negra, vítima de violência e solidão a qual M. estava submetida foi fundamental para compreender o caso. Outro desafio foi quando M. se recusou ao seguimento com profissionais de saúde mental por não reconhecer seu problema como desse campo, tornando a Atenção Primária o local mais apropriado, talvez único, para acompanhamento desse caso, apesar de sua raridade.